«A mulher é o complemento do homem, como o homem é o com- plemento da mulher: mulher e homem completam-se mutuamente, näo somente do ponto de vista fisico e psiquico, mas também do ponto de vista ont016gico». (Conselho Pontificio «Justiqa e Paz», Compéndio da Doutrina Social da Igreja, p. 104). « The view we take here is that there's no place for the state in the bedrooms of the nation». (PIERRE TRUDEAU, Ministro da Jus- tiga do Canadå em 1967, posteriormente Primeiro-Ministro, responsåvel pelo Canadian Criminal Amendment Act, 1968-1969, que descriminalizou a sodo- mia no Canadå). 1. Apresentacäo do tema Muito se tem falado, ultimamente, em Portugal, a respeito do casamento entre pessoas do mesmo sexo, verificando-se uma crescente mobilizacäo de forcas compostas por associacöes civicas de defesa dos direitos LGBTI, partidos politicos situados å esquerda do espectro politico e personalidades ligadas a diferentes secto- res da sociedade visando o seu reconhecimento, facto que, inclusivamente, deu jå origem å apresentacäo de propostas legislativas nesse sentido Num pais em que, apesar de formalmente laico, a esmagadora maioria da popu- lacäo professa a religiäo catolica, seria inimaginåvel, até hå poucos anos, uma discussäo do teor da que agora se comeca a desenrolar em torno do casamento entre pessoas do mesmo sexo. A semelhanca do aborto, da clonagem reprodutiva ou da pena de morte, o tema objecto deste estudo constitui matéria fracturante que desafia a nossa consciéncia colectiva, colocando questöes de ordem moral, religiosa, sociologica e antropologi_ ca a que, naturalmente, o Direito näo pode ficar indiferente. Inerente a toda esta problemåtica estå, inevitavelmente, a concepcäo judaico- cristä do matrimonio, concebido como uma uniäo entre um homem e uma mulher naturalmente destinada å procriacäo e å educacäo dos filhos, e por isso incompati- vel com qualquer outra forma de uniäo, seja ela poligåmica, incestuosa ou homos- sexual Por outro lado, a pråtica de actos sexuais entre pessoas do mesmo sexo tem Sido desde sempre condenada por essa mesma tradicäo. Na Biblia Sagrada, o Antigo Testamento e o Novo Testamento contém passagens que testemunham esta rejeicäo: «Se um homem coabitar sexualmente com um varäo, cometeram ambos um acto abominåvel; seräo os dois punidos com a morte; o seu sangue cairå sobre eles» (Lv 20, 13); «Foi por isso que Deus os entregou a paixöes degradantes. Assim, as suas mulhe- res trocaram as relacöes naturais por outras que säo contra a natureza. E o mesmo acontece com os homens: deixando as relacöes naturais com a mulher, inflamam-se em desejos de uns pelos outros, praticando, homens com homens, o que é vergonhoso' e recebendo em si mesmos a paga devida ao seu desregramento (Rm 1, 26-27); näo sabeis que os injustos näo herdaräo o Reino de Deus? Näo vos iludais: nem os devas Sos, nem os idölatras, nem os adülteros, nem os efeminados (...) herdarao o Reino de Deus » (1 Cor 6, 9-10)