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UM E-Theses Collection (澳門大學電子學位論文庫)

Title

A poesia classica chinesa : uma leitura de traducoes portuguesas

English Abstract

Introdução Para o Ocidente, a tradução da poesia chinesa representa um desafio insolúvel e de eterno fascínio, pois ao longo da sua longa história, esta poesia formou um mundo próprio, que tem de universal e perene como estesia e experiência humana, mas com características radicalmente diferentes das poesias ocidentais, tomando-se assim um mar cheio de "riscos" mas também de surpresas para qualquer tradutor. Para descobrir e conhecer este mar, não faltam aventureiros, entre os quais se figuram portugueses e brasileiros. A primeira tradução portuguesa de poesia chinesa surgiu em 1890. O tradutor foi o poeta António Feijó que realizou o seu trabalho a partir de tuna tradução francesa em prosa, sob o título de Le livre de jade, feita por Judith Gautie Walter. A tradução portuguesa, intitulada de Cancioneiro Chinês, reuniu 17 poetas da dinastia Tang (618—907) e foi feita de acordo com a estética parnasiana, tendo sido favoravelmente acolhida pelo leitor português porque era "uma poesia tão sentida, tão original, tão mimosa e característica como a que vulgarisar entre nós..." 2 A outra tradução foi concretizada em Macau. Como gande admirador da cultura chinesa, Camilo Pessanha, que veio residir para Macau em 1894, verteu para português Oito Elegias Chinesas. Dominando alguns caracteres da escrita chinesa, conhecimento evidentemente insuficiente para a reescrita de um original em chinês, ele recorria ao bondoso apoio dos sinólogos chineses. A tradução foi sucessivamente publicada, em 1914, nas páginas do jornal macaense O Progresso e só foi editado em livro em 1931 pelas Edições Descobrimentos, Lisboa. Trata-se de poemas chineses que remontam à dinastia Ming (1368-1644), mas que não ocupam um lugar relevante na tradição da poesia chinesa. Camilo Pessanha inicia a sua tradução com um prefácio interessante em que expõe sucintamente as características específicas da poesia chinesa e a sua metodologia de tradução. E curioso observar o material escolhido por Camilo Pessanha para a tradução. Pelo prefácio redigido para Oito Elegias Chinesa e pelos ensaios que escreveu sobre a cultura chinesa, o poeta mostrou-se conhecedor invulgar da literatura chinesa e, por conseguinte, não seria justificável o seu desconhecimento dos gandes poetas da China. Mas os poemas que ele traduziu não figuram entre as melhores obras na literatura chinesa. Deste modo, a escolha de Camilo Pessanha deve-se provavelmente ao facto de estes poemas espelharem os mesmos traços da sua vivência: solidão, exílio, fuga a um mundo real insuportável e nostalgia da pátria abandonada. A terceira tentativa também apareceu em Macau, em 1951. O tradudor Francisco de Carvalho e Rêgo era um filho do cruzamento de etnias ocidental e oriental que, embora educado pela cultura portuguesa, sentia o interesse em sensibilizar os portugueses residentes em Macau para alguns aspectos da cultura chinesa. A tradução, intitulada de Mui-Fá (ameixoeira), reuniu alguns poetas da dinastia Tang em que "nos aparecem os grandes poetas da China a assentá-la em sólidos alicerces, a darem-lhe feição própria em perfeitas linhas arquitectónicas, construindo o edificio que convinha à maturidade alcançada.' A par de poetas da dinastia Tang, entre os quais sobressaem Li Bai e Du Fu, o tradutor também integrou alguns poetas de outras épocas e de uma poetisa da actualidade que é desconhecida. Verifica-se certa confusão na romanização dos nomes dos poetas para além da falta de informação sobre a bibliografia, o que tornou o livro menos cuidadoso no sentido da compilação. Entre poucos tradutores que se dedicam à divulgação da cultura chinesa, é obrigatório destacar o Padre Joaquim Guerra que, com um esforço monumental, trouxe para a língua portuguesa uma boa parte dos clássicos chineses, entre os quais se figura o Livro dos Cantares (Shi Jing). Trata-se do primeiro cancioneiro chinês, composto de 311 canções, coligidas provavelmente por Confúcio, que remontam a mais de dois mil anos antes de Cristo. "Não são produções artísticas dum só autor; inspiraram-se no variado convívio humano dos séculos e dos povos que cedo formaram a gigantesca e sólida Pátria da China. Mais que obras de arte, as Canções são instantâneos da vida individual, familiar, religiosa, social e política dos Chineses, apanhadas ao natural, formando, no conjunto, uma imagem impressionante de humanismo e civilização, capaz de inspirar e animar a qualquer povo irmão e a qualquer pessoa assim descreve o tradutor no prefácio, bem ciente da responsável", origem da literatura chinesa. Além do prefácio, o livro é acompanhado de uma longa introdução e de um suplemento detalhado de notas críticas e históricas, de interesse indispensável para o receptor. A primeira edição foi feita por Jesuítas Portugueses em 1979, com o patrocínio do Governo de Macau. Em 1988, o Instituto Cultural de Macau e Aidan Publicities & Printing realizaram em conjunto a segunda edição que presentemente se encontra esgotada. Os poetas chineses mais traduzidos são Li Bai e Du Fu, os quais foram também integados por Jorge de Sena na sua obra Poesia de 26 Séculos 6. O tradutor reuniu três poemas de Li Bai e um de Du Fu, e juntou uma biogafia de cada um no fim do livro. A fascinante tradução, baseada numa recriação, foi efectuada a partir de versões em outras línguas. Li Ching, professor de etnia chinesa que ensinava a língua e cultura Chinesa na Universidade de Lisboa, traduziu para português três poemas te Li Bai, os quais foram publicados na Separata da Revista da aculdade de Letras7. Os poemas aparecem traduzidos carácter a carácter anotações sobre metáforas tradicionais, aspectos geográfico- nbólicos e valores semânticos pluri-siglificativos de certos caracteres neses. Em 1995, Li Ching publicou Antologia da Poesia Chinesa 8 que ne 36 poetas, desde o poeta mais antigo Qu Yuan até aos poetas dos nossos dias. São no total 36 poemas e a tradução de cada poema é acompanhada de uma curta biografia do poeta, do poema original em caracteres e de uma transcrição fonética em pinyin , como também duma tradução palavra a palavra. Jorge de Sousa Braga é outra pessoa que se dedicou à tradução de poesia chinesa devido à sua sedução pelo Oriente em que "talvez—e para lá do Oriente—eu esteja a procurar através da poesia(...) um Oriente ao Oriente do Oriente". 10 A obra, sob o título de Sono de Primavera, integou 18 autores, entre os quais se destaca Li Bai, com 21 poemas. O número de poemas de outros poetas oscila entre um e dois. De acordo com a indicação que vem no final da antologia, as traduções são feitas a partir de versões em francês, inglês e castelhano feitas por sinólogos ou poetas de grande nome, como Arthur Valley, Paul Demiéville, Ezra Pound, Rafael Alberti, Octávio Paz, entre outros. Gil de Carvalho foi leitor de português em Beijing (Pequim) e publicou em 1989, através da editora Assírio & Alvim, Uma Antologia de Poesia Chinesa, que pela primeira vez apresenta poetas chineses de todas as dinastias. Mas o livro reúne apenas 41 poetas numa vastidão temporal que vai do Livro dos Cantares até aos poetas Nalon Xingle, do século XVII. Os poetas antologiados estão representados pelo número de um a três poemas, e uma parte dos poemas aparecem em português e chinês, mas não existe a tradução literal. Tendo em conta o leitor alvo, o tradutor começa a sua antologia com uma introdução subdividida em cinco curtos capítulos que explica a cultura chinesa, modos principais da poesia chinesa e o critério de compilação. Aliás, o tradutor assume a insuficiência do seus conhecimentos de chinês: "Os poemas foram transportados a partir do original, mas com recurso—no meu caso indispensável—a pelo menos uma tradução em línguas ocidentais. Ter-me-ia sido impossível traduzir sem recurso a estas. E curioso notar que Uma Antologia de Poesia da China, de Gil de Carvalho, e Antologia da Poesia Chinesa, de Li Ching, manifestam uma semelhança espantosa tanto na escolha dos poemas como na determinação morfológica e sintáctica, o que se deve provavelmente a um conhecimento mútuo. António Graça de Abreu, tal como Gil de Carvalho, trabalhou vários anos em Beijing; essa estadia marcou-o indelevelmente, a ponto de levá-lo a traduzir para português alguns dos maiores poetas chineses, lamentando sempre o esquecimento de Portugal relativamente a uma cultura tão poderosa e à qual está ligado por laços multi-seculares. Sabe pouco chinês mas contou sempre com o apoio indispensável de chineses e, sobretudo, das duas chinesas que contribuíram muito para o seu trabalho. Começou por traduzir Li Bai, Poemas de Li Bai foi editado pelo Instituto Cultural de Macau em 1990 e obteve em 1991 0 Grande Prémio de Tradução, atribuído conjuntamente pelo Pen Club e pela Associação Portuguesa de Tradutores. A obra, composta de 202 poemas, extraídos de mil poemas existentes do autor, intega basicamente os melhores poemas do poeta. A primeira edição, de dois mil exemplares, esgotou-se e, em 1996, foi lançada uma segunda, revista e aumentada, pela mesma editora. A seguir a Li Bai, Graça de Abreu traduziu sucessivamente Bai Juiyi e Wang Wei, outros dois grandes poetas da dinastia Tang, tendo as duas traduções, Poemas de Bai Juiyi e Poemas de Wang Wei, sido editadas pelo Instituto Cultural de Macau em 1991 e em 1993, respectivamente. Além destas traduções feitas em Portugal e em Macau, a poesia chinesa também foi traduzida no Brasil. A primeira tentativa pertence a Machado de Assis, que traduziu oito poemas a partir do Le livre de jade, de Judith Walter, e intitulou Lira Chinesa (1870), inserido na série de Falenas. Haroldo de Campos, conhecido poeta e crítico brasileiro, um dos fundadores da poesia concreta também verteu para português alguns poemas do Livro dos Cantares, Li Bai, Li Shangyin, outro poeta de relevo da dinastia Tang, entre outros. Os poemas foram publicados em jornais ou incluídos nos seus dois livros de crítica: A Arte no Horizonte do Provável (1969) e A Operação do Texto (1976). Actualmente prepara uma recolha bilíngue de todas as suas "trans-criações" de poesia chinesa (incluindo inéditas) para uma nova edição. Em 1996, a Editora Nova Fronteira, no Rio de Janeiro, editou um conjunto das fascinantes traduções de poemas de Li Bai e Du Fu, feitas pela poetisa brasileira Cecília Meireles, que se dedicou ao longo dos anos ao estudo, tradução e divulgação da poesia oriental. O livro reúne cerca de 70 poemas de dois poetas, acompanhado de uma introdução assinada por Alexei Bueno, para além de dois textos dedicados respectivamente a Li Bai e a Du Fu, da autoria da tradutora. Como a maioria absoluta dos tradutores em questão não conhecem a língua chinesa ou reconhecem a escassez de conhecimentos acerca dela, como por exemplo Gil de Carvalho e Graça de Abreu, a maior parte das traduções acima referida foi realizada a partir de versões em outras línguas estrangeiras, especialmente o inglês e o francês. Apenas as traduções de Li Ching são mais directas dado o tradutor ser chinês e conhecer as línguas e culturas de partida e de chegada. Ao abrigo da ajuda dos outros, as traduções de Camilo Pessanha também foram feitas completamente a partir do original, uma vez que os poemas vertidos por ele ainda não têm versões em outras línguas estrangeiras. No caso de Gil de Carvalho e Graça de Abreu, eles declararam terem acesso directo aos textos originais mas com o recurso necessário a versões em outras línguas ocidentais. Em relação ao corpus deste trabalho, é composto simplesmente por Oito Elegias Chinesas, de Camilo Pessanha, Uma Antologia de Poesia Chinesa, de Gil de Carvalho, Antologia da Poesia Chinesa, de Li Ching, Poemas de Li Bai, Poemas de Wang Wei, Poemas de Bai Juyi, todos estes de Graça de Abreu. Esta escolha obedece a dois motivos: o primeiro consiste em que estas traduções foram produzidas basicamente a partir dos originais, o que toma mais operacional uma análise comparativa sobre os textos originais e as suas traduções, visto que o estudo sobre uma tradução indirecta constitui sempre uma tarefa altamente condicionada; o segundo atende ao facto de que estas traduções são, até ao momento, as representações mais ordenadas e coerentes da poesia chinesa em português, ou dos poetas individuais, ou de uma época, ou de toda a tradição poética, fomecendo assim uma margem mais alargada de manobra. Sem prescindir da teoria da tradução, cujos pontos mais interessantes para este trabalho procuramos esboçar no primeiro capítulo, e da poética chinesa, o nosso objectivo reside na tentativa de verificar quais são os modelos que orientaram os tradutores na sua prática translatória, como os tradutores interpretaram os originais, como eles encararam as características do sistema linguístico-cultural de partida na sua relação com o sistema de chegada, e como procuraram e estabeleceram equivalências em vários aspectos nos intersistemas, e por onseguinte, o que ganharam e perderam estas traduções.

Issue date

1998.

Author

姚京明,

Faculty
Faculty of Arts and Humanities (former name: Faculty of Social Sciences and Humanities)
Department
Department of Portuguese
Degree

M.A.

Subject

Chinese poetry -- History and criticism

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Location
1/F Zone C
Library URL
991000158859706306